Atravesso as montanhas e chego a singela vila interiorana. Localizada a menos de uma centena de quilômetros da capital, a pequena cidade era o grande refúgio dos estressados habitantes da metrópole. Era uma estância hidromineral e suas águas eram procuradas para os mais diversos fins.
Era época de Natal, e minha intenção era justamente entregar presentes às crianças carentes do lugar. Embora a capital também estivesse repleta de pessoas nessas condições, queria aproveitar a ocasião para usufruir do clima e das belezas de Lagoa Funda.
Após hospedar-me em uma pousada no centro da cidade, fui passear pela praça principal, enfeitada de pinheiros decorados que contrastavam com os ipês e jacarandás nativos; milhares de bolinhas de isopor estavam espalhadas nos canteiros, a imitar flocos de neve. Pelas lojas, papais noéis sentados, à procura das crianças e, por tabela, dos pais que receberam o 13°. Próximas ao parque, charretes coloridas transportavam turistas, ávidos também para conhecerem as centenas de lojas de artesanato e lembrancinhas.
No dia seguinte à minha chegada, conheci um guia-mirim, Lucas. Como trouxera muitos presentes, resolvi lhe entregar um. Mas pensei em fazer isso na sua própria casa, até para conhecer melhor as pessoas e costumes do lugar. Combinamos que eu passaria lá no final da tarde, já que Lucas trabalharia durante o dia acompanhando os turistas. Por outro lado, eu também passaria o dia entregando os brinquedos em um orfanato.
No início da noite, entrei na tortuosa rua calçada de paralelepípedos; não estava tão bem conservada, certamente por estar localizada na periferia e não ser passagem freqüente de turistas. Achei a casa do garoto sem dificuldades: ele me esperava no portão.
Estava sozinho. A mãe rezava na igreja, o pai, ainda trabalhando, e os 3 irmãos na casa dos vizinhos, onde ele também estaria se não estivesse a minha espera.
Após entrar na casa e me sentar no sofá, abri a sacola e lhe dei o presente. Apesar da impetuosidade de seus 8 anos, abriu o pacote com cuidado (certamente para usar o papel de presente em outra oportunidade) e passou a admirar o boneco de um Papai Noel de pano, vestido com seu casaco vermelho e conduzindo o trenó com a ajuda das renas. O trenó possuía pequenos pacotinhos, como se fossem presentes.
“Renas, casaco de frio, trenó?” Deve ter pensado o garoto, num instante de reflexão que, confesso, nem eu, como adulto, tivera. Apesar da inconfundível simpatia desse símbolo, o Papai Noel naqueles trajes, com aqueles animais e conduzindo um trenó não parecia combinar com o que se via pelas ruas do nosso país.
— É bonito. — respondeu-me afinal — mas meu Papai Noel é outro.
— É bonito. — respondeu-me afinal — mas meu Papai Noel é outro.
— E qual é? — perguntei, espantado.
Ouvindo um barulho na rua, ele pegou-me pela mão e me puxou para fora da casa. Próximo ao portão, apontou-me alguém e me disse:
— É ele.
— É ele.
Era seu pai, vestido com uma surrada calça e camisa social meio aberta; conduzia uma colorida charrete de turistas, guiadas por dois cavalos sem raça definida. Na pequena carroça, algumas sacolas imitando presentes: na verdade, o alimento do dia.
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