Marcus escuta
barulho na sala de espera e sai do escritório. Um homem jovem, sozinho e
aparentemente nervoso, olha para os lados.
— Bom dia.
— O senhor é o
advogado Marcus Antonio de Sá Monteiro? — perguntou o rapaz, sem cumprimentá-lo.
— Sim, o seu nome
é...
— Gostaria de tirar
algumas dúvidas — interrompeu-o o visitante.
Os dois entram no escritório.
Uma ampla mesa de granito os separa.
— O que deseja, seu...
— Afonso.
— Sim.
— Qual a pena média para um
homicídio?
— Pena média? Bom, isso varia
muito. Depende dos antecedentes da pessoa que matou, se confessou para a
polícia, as características do crime...
— Qual o mínimo e o máximo,
então?
— Varia de seis a trinta anos.
— Trinta?
— Sim, mas isso em casos de
muitos agravantes. — pegou então um Código Penal na gaveta e apontou rapidamente
o parágrafo segundo do artigo 121. Afonso leu o texto com sofreguidão: motivo
fútil... morte com emprego de veneno... fogo... explosivo... tortura... asfixia...
sem chance de defesa para a vítima...
— Motivo fútil... se o motivo for
sério, não é contado como agravante?
— Se realmente for sério, não.
— Uma traição?
Marcus silenciou-se por alguns
momentos, olhando fixamente para o homem a frente, que também o encarava,
segurando as mãos de forma nervosa.
— O senhor matou alguém?
— Inclui traição?
—Sim, pode incluir traição.
— ...
— O senhor matou alg...
— Então – Afonso interrompeu,
novamente - se um homem de bons
antecedentes mata o amante da esposa logo
após descobrir que foi traído, mas sem o uso daqueles agravantes, e ainda se
entrega e confessa o crime a polícia, a pena pode se aproximar desses seis
anos?
— Sim, nesses casos não costuma
ultrapassar os 12 anos. Mas quase ninguém cumpre a pena toda no Brasil.
— E como é isso?
— A lei fala que se o preso
cumprir dois quintos da pena e tiver bom comportamento, pode ser liberado mais
cedo. Nesse caso, seriam uns cinco anos. A pessoa iria para o regime
semi-aberto e logo depois poderia começar a trabalhar fora e apenas dormir na
prisão. Em sete ou oito anos poderia estar em casa.
— Sete ou oito anos.
Afonso calou-se, como a fazer
cálculos mentais. Ao fim, levantou-se, tirou uma arma da cintura e alvejou uma
única vez o advogado, no peito. Enquanto Marcus agonizava, jogou sobre o peito ensanguentado
do homem uma fotografia datada de dez anos antes: ainda em cores vivas,
mostrava a vítima com a esposa de Afonso. Depois, jogou outras fotos mais
recentes a sua volta, incluindo a daquela manhã, tirada pelo próprio assassino
em um motel barato na saída da cidade...
— Sete ou oito anos... Ainda não
pagam esses dez anos de traição. Vale a pena. — concluiu, encarando o ainda
moribundo advogado, enquanto pegava seu celular e ligava para a polícia.
20/04/09